segunda-feira, 25 de abril de 2011

VIII

Não te chamo para te conhecer
Eu quero abrir os braços e sentir-te
Como a vela de um barco sente o vento

Não te chamo para te conhecer
Conheço tudo à força de não ser

Peço-te que venhas e me dês
Um pouco de ti mesmo onde eu habite

Sophia de Mello Breyner
in Tempo Dividido

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Triângulo

Parecia uma boa relação triangular:
Eu gostava de ti
E de mim.

Eu gostava de ti como só se gosta
pela primeira vez: como se cada vez
fosse a ultima vez.

Eu gostava de ti e da maneira como tu,
lendo por cima do meu ombro, sabias dizer:
Sim, senhor, que bem que escreves,
disso sabes tu, mas deixa-me ver.

E gostava de mim, ah como gostava
de mim depois disso, e que bom que era
ser eu próprio
nos teus braços.

Herman de Koninck

segunda-feira, 11 de abril de 2011

As minhas mãos.

As minhas mãos mantêm as estrelas,
Seguro a minha alma para que se não quebre
A melodia que vai de flor em flor,
Arranco o mar do mar e ponho-o em mim
E o bater do meu coração sustenta o ritmo das coisas.

Sophia de Mello Breyner
in Obra Poética

domingo, 10 de abril de 2011

Segundo nascimento

Quando o barco rolar na escuridão fechada
Estarás perdida no interior da noite no respirar do mar
Porque esta é a vigília de um segundo nascimento

O sol rente ao mar te acordará no intenso azul
Subirás devagar como os ressuscitados
Terás recuperado o teu selo a tua sabedoria inicial
Emergirás confirmada e reunida
Espantada e jovem como as estátuas arcaicas
Com os gestos enrolados ainda nas dobras do teu manto

Sophia de Mello Breyner
excerto do poema Ítaca in Obra Poética

domingo, 3 de abril de 2011