terça-feira, 18 de março de 2014
The fountain...
As confidências demoram-se no céu da boca
como as nuvens lentas do Outono. Sopro-as,
para que o céu se limpe e apenas uma névoa vaga
se cole ao que me queres dizer; mas
encostas-me os lábios ao ouvido e tu, sim,
é que me contas que céu é este, e de onde
vêm as nuvens que o cobrem. Sentimentos,
emoções, paixões, interpõem-se entre
cada frase. Nem há outros assuntos
quando nos encontramos, e me começas a falar,
como se fosse o coração a única
fonte do que dizemos.
Nuno Júdice, in POESIA REUNIDA
quinta-feira, 13 de março de 2014
O privilégio...
Nada, nem sequer o verão
está completo. Menos ainda o colar
de sílabas que, desvelado,
te ponho à roda da cintura.
Nunca me pediste mais, nunca
te dei outra coisa.
Quando juntamos as mãos esquecemos
que somos culpados da nossa inocência.
E sorrimos, alheios
ao sol que declina, à estrela
do norte que sabemos no fim.
O privilégio da vida é este
silêncio musical que do teu olhar
cai nos meus olhos
e regressa a ti acrescentado
pela luz da manhã varrendo o mar.
Eugénio de Andrade
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